Luto na Literatura Nacional
Matilde Rosa Araújo (1921-2010) José Saramago (1922-2010)
“Cavalinho, cavalinho
Que baloiça e nunca tomba;
Ao montar meu cavalinho
Voo mais do que uma pomba!"
- Vês, mãe? Já sei ler!
- Disparate, miúda, sabes lá ler! Ainda não andas na escola há um mês, como é que sabes ler?
- Mas tu ouviste, mãe! Eu li-te o "Cavalinho, cavalinho"!
- Decoraste, e agora queres convencer-me que lês?
- Leio, mãe. Vê bem: escolhe uma palavra para eu ler.
A mãe colocou o dedo sob a palavra “cavalinho”.
- Ah!, É fácil: cavalinho.
A mãe espantou-se, mas retrucou:
- É fácil, pois, é a palavra mais repetida. Parva é que tu não és. Vejamos esta! – disse, indicando a palavra “montar”.
- Montar – disse, prontamente.
- Esta?
- Tomba.
- Ó homem, vem cá ouvir isto! A nossa filha já lê!
O excerto de um poema que é um marco na vida de tantas gerações de crianças. A autora do poema? Matilde Rosa Araújo, n’O Livro de Tila. A escritora, que no dia 6 de julho morreu, aos 89 anos, na sua casa, em Lisboa, fez as delícias literárias de várias gerações. Publicou cerca de duas dezenas de obras para crianças, mas não foi só: a sua vida destacou-se, também, pela dedicação aos problemas e direitos das crianças. Vários prémios - melhor livro para a Infância atribuído pela Fundação Calouste Gulbenkian em 1996; Grande Prémio de Literatura para Criança da Fundação Calouste Gulbenkian, em 1980; prémio para melhor livro estrangeiro, O Palhaço Verde, atribuído pela associação Paulista de Críticos de Arte de São Paulo, Brasil, em 1991 – atestam o seu valor literário. Honras em vida, confirmadas com a atribuição do grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, em Maio de 2004. Honras na morte com velório na sede da Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa e a atribuição da Medalha de Honra do município de Cascais à escritora.
De acordo com a Agência Lusa, um inédito da autora, Florinda e o Pai Natal, será publicado em Outubro. Ficamos à espera!
Que tristeza, Matilde,
Que saudades, minha amiga!
Mas o luto literário começou mais cedo, no dia 18 de junho, com a morte de José Saramago. O escritor, segundo noticiou o Público,” encontrava-se doente em estado "estacionário", mas a situação agravou-se” (publico.pt, 18/06/2010). Em sequência da sua morte, o corpo foi cremado e as cinzas ficaram em Portugal. Várias obras literárias testemunham o valor de Saramago como grande nome da literatura universal. Se o primeiro romance do autor, Terra do Pecado (1947), não é tão conhecido do grande público, o próprio Saramago desvalorizava o livro e não o incluía na sua bibliografia, Levantado do Chão, que escreveu mais tarde, em 1980, tornou-o um escritor com nome. Uma obra bem conhecida do público juvenil é o Memorial do Convento, que os alunos do secundário estudam. Outras obras, muitas delas envoltas em polémica, (são polémicos os escritores que, com desassombro e com arrojada visão do futuro, interpelam os homens e os poderes do seu tempo”, diz Carlos Reis, citado pelo Público), revelam José Saramago a nível mundial: O Ano da Morte de Ricardo Reis , A Jangada de Pedra, História do Cerco de Lisboa, Ensaio sobre a Cegueira, Todos os Nomes,…