Teresa Saavedra
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Escritora portuguesa, Maria Teresa Sousa Pereira de Saavedra nasceu em 1947, noPorto, sendo a mais nova de três irmãs.Educada num meio profundamente conservador de uma família da média/altaburguesia, a presença masculina, no que respeita aos valores impostos, marcou-adefinitivamente.
Embora órfã de pai desde os sete anos de idade, esses valores conservadoresresistiram ao tempo e coabitaram dentro das quatro paredes, sem granderesistência da mãe e das suas duas irmãs.
Bastante mais nova que as outras duas irmãs, a autora, desde muito cedo,demonstrou uma total oposição a este paradigma educacional que remetia a mulherpara um papel secundário e "para a vida de casa".
Feitos os estudos até ao antigo 5.º ano do liceu, num Colégio de Freiras, "saltou"para a ESBAP (Escola Superior de Belas Artes do Porto) onde, contra a vontade desua mãe, se licenciou em Escultura.
Tendo sido orientada, durante o estágio, pelo professor Hélder Pacheco, homemreconhecidamente inovador no que diz respeito às conceções estéticas e ao modode olhar a disciplina de desenho, a sua formação na área das artes plásticas marcouindubitavelmente toda a sua estética literária, dando origem a uma escrita muitovisual que se apresenta como resultado de uma "pincelada na tela".
Em 1995, edita o seu primeiro livro Memória das Doze Casas (segundo a autora difícilde catalogar quanto ao género). Situada a ação da narrativa num tempo que é o dajuventude, a obra está dividida em duas partes, apresentando uma estruturainterna dual.
Na primeira parte, assente em momentos descritivos exaustivos, o narradorfranqueia-nos as portas de uma moradia da média burguesia portuense, situada nazona mais alta da cidade. Esta descrição minuciosa, não só física mas tambémpsicológica (descreve-se o quarto, o escritório onde o pai escondia os livros queconsiderava de leitura proibida para as mulheres, etc.) rica e diversificada emadjetivos, permite-nos classificar este espaço como a personagem principal destemomento da narrativa.
Já na segunda parte, diretamente relacionada com a primeira, enquanto alusão àRua onde se situava a casa, apresenta-nos o narrador, com grande afetividade, asatividades de rua, da época, personificadas por um rol de personagens coletivas, detipo vicentino, que desfilam na passerelle do seu quotidiano: a peixeira, a leiteira, apadeira, o ceguinho e a sua acompanhante, o carteiro, o polícia, etc.
Maioritariamente femininas, estas são personagens que davam vida ao dia dacidade - "a cidade, durante o dia, é feminina". Personagens anónimas, de umagrande densidade psicológica, que, lado a lado com as três personagensindividualizadas e nominadas, a Sra. Ana (cozinheira da casa), a Senhora (dona dacasa) e a Menina, enformam a narrativa.
Por esta altura, a autora lançou-se numa experiência, no âmbito da literatura infantile juvenil, sob o pseudónimo "Maria Mata", tendo publicado quatro títulos.
Em 2000, chegou ao prelo o seu romance Inventário Frente Ao Espelho, pelas mãosda Campo das Letras Editores.
Escrito a partir da experiência de um amigo com fortes convicções ideológicas deesquerda, a autora pretende registar, através de uma narradora heterodiegética eomniscientemente subjetiva, o sonho de uma geração empenhada em mudar omundo.
Narrado no feminino, este romance, fruto de uma "escrita desencantada", reflete,então, o desencanto de uma geração cujos objetivos saíram logrados, enquantosonho apenas sonhado.
Na verdade, imbuídas de ideais revolucionários, as personagens masculinas(António e Ricardo) não conseguiram, contudo, cortar o cordão que ainda as ligavaao ventre conservador, contradição que se vai refletir necessariamente norelacionamento com as personagens femininas.
Esta frustração do "ser feminino" é veiculada por momentos epistolográficos (ascartas de Miriam), que, imprimindo à narrativa dolorosos momentos de intensidadelírica, servem para que a personagem faça a catarse do fracasso do seu casamentocom o ex-marido António.
Com personalidades muito diferentes, Miriam e Lídia personificam o universofeminino que, no entender da autora, não conseguiu ainda situar-se no espaço aque tem direito - o de pé de igualdade com o "ser masculino".